sábado, junho 10, 2006

Nocturne

Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão. Dlão.
Onze horas. Não! Vinte e três.
É noite.
Olho o céu índigo e contemplo as estrelas. Já há muitos anos que são apenas brilhos esborratados numa imensa tela negra. Mas nem por isso deixo de as observar.
Nas minhas costas, a lua imensa desdobra-se em três, ou quatro, círculos leitosos.
Sei-o, não necessito de a olhar. Mesmo assim volto-me.
Nunca me canso de olhar o céu.
Caminho, agora, pelo parque mal iluminado. Mas não me inquieto.
Detenho-me por momentos: ao longe há um candeeiro, de onde me encontro diviso silhuetas de pequenos morcegos. Embora não seja uma novidade para mim, agrada-me observa-los – Senhores da Noite – esvoaçando em busca de pequenos insecto.
ão ão ão
Volto-me instantaneamente. Um cão corre desvairado pela relva, ladrando alegremente. Ao aproximar-se abranda, parando para me cumprimentar. Afago-lhe o focinho. Abana a cauda, num gesto de reconhecimento, e parte novamente na sua demanda. Pouco depois o dono, movendo-se numa moleza exasperante, murmura um inaudível “boa noite”, e segue atrás do cão.
O parque volta a ficar em silêncio. Esta quietude é apenas ilusória, se me concentrar posso ouvir os sons da noite.
As folhas a dançarem com a brisa. Um galho estala.
A relva agita-se, vislumbro um vulto – talvez um pequeno rato – a deslizar sorrateiramente para a toca.
O pio do mocho. E um bater de assas.
Apenas uma pequena amostra da azáfama nocturna.
Ao longe, risos despertam a minha atenção. Uma conversa animada, mãos dadas. Param e beijam-se demoradamente. Ao passarem por mim, trocam olhares cúmplices, apaixonados. E soltam, em uníssono, um melodioso “BOA NOITE!”. Retribuo a saudação. Sorrindo divertida.
Sigo por entre as árvores, posso imagina-las escondendo seres tenebrosos, sombrios, espiando a minha passagem. Se fizer um pequeno esforço consigo ver os seus olhinhos brilhantes postos em mim, e ouvi-los sussurrar. E isso não me assusta, diverte-me.
Não paro, chegou a hora de regressar.
Caminho lentamente, inspirando o perfume da noite. Encantador. Inebriante. Vem com a brisa fresca e envolve-me. O odor da relva, das arvores. A fragrância de flores nocturnas. Tão intensos. Quase palpáveis.
...
Deixo o parque para trás, a luminosidade artificial quebrou o encanto, entro num outro mundo.
...

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